A entrevista do novo presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Granda Filho, reproduzida em rede nacional pela jornalista Miriam Leitão, é um exemplo claro do nível em que a disputa política travada na grande mídia atingiu no país. É muito grave que dois “formadores de opinião”, aproveitando do amplo acesso que têm aos meios de comunicação de massa, usem do artifício da deturpação da realidade vivida pelos trabalhadores para defender a terceirização da atividade fim e a aprovação do negociado sobre o legislado, afirmando que os sindicatos não falam pelos trabalhadores.
Ambos, o presidente do TST e a jornalista global, afirmam categoricamente que a reforma trabalhista é fundamental para a preservação dos empregos na atual crise capitalista. Ives Granda Filho chega a afirmar, sem qualquer amparo em estudos sérios e baseado em mera percepção pessoal, que a reforma trabalhista “não só ajudaria, mas resolveria praticamente” a crise. Ocultam o fato de que os diversos países que utilizaram do expediente da reforma trabalhista com retirada de direitos após a crise de 2008 – casos de Espanha, Portugal e Grécia, por exemplo –, não apenas destruíram seu mercado interno como também agravaram violentamente o problema do desemprego, encontrando-se ainda hoje, em torno de cinco anos após a adoção das medidas, patinando e vivendo ampla instabilidade social e política.
Miriam Leitão, como boa papagaia subserviente ao poder constituído, não hesitou em compartilhar desta opinião, reafirmando o dito pelo presidente do TST: “a reforma trabalhista é inevitável, única maneira de combater o aumento do desemprego”. Ambos, visando construir uma ideologia extremamente útil aos empresários reacionários, apontam que caso não haja uma reforma trabalhista, a crise irá se aprofundar e o desemprego irá disparar. Neste ponto chegam ao ridículo ao comparar uma forjada lei do mercado com a lei da gravidade. Visam assim, descaradamente, construir uma opinião pública favorável aos interesses de grande parte do grande empresariado brasileiro e das grandes multinacionais estrangeiras.
Esquecem convenientemente que enquanto a lei da gravidade existe independentemente da ação das pessoas, a lei do mercado é uma construção dos seres humanos, dependendo em última instância da disputa política da sociedade. Aliás, chamar as regras de funcionamento da economia capitalista de “lei do mercado”, por si só, já é uma estratégia utilizada pelos defensores do capital para enganar os trabalhadores. Ocultam que o que chamam de “mercado” não passa de um pequeno grupo de detentores do dinheiro, das fábricas, dos comércios, das terras e do poder. Ou seja, querem limitar a vida das pessoas às leis do mercado para garantir o monopólio da política para as elites parasitárias da sociedade brasileira, que vivem apenas do suor daqueles que realmente trabalham.
Na linha da estratégia dos comentaristas, usam da estatística de que mais de 40% dos trabalhadores brasileiros pertencem ao mercado de trabalho informal (onde não há proteção direta dos sindicatos) para afirmar que os sindicatos não falam em nome de todos os trabalhadores e que visam apenas defender seus interesses particulares. Esquecem, mais uma vez convenientemente, que nos locais onde existem sindicatos fortes vigoram as melhores condições de trabalho, sendo que quem alimenta a informalidade e a fraqueza na organização de algumas categorias não são os trabalhadores, mas sim grande parte dos empresários que fogem dos sindicatos como o diabo da cruz. É óbvio, para quem só vê o trabalhador como fonte de exploração e de lucros, não haveria de deixar de ver os sindicatos comprometidos com a classe trabalhadora como inimigos.
Quando afirmam que a atual legislação, que submete o negociado em convenção coletiva de trabalho à legislação trabalhista (ou seja, não se pode negociar nada abaixo do que os direitos garantidos na lei, apenas acima), favorece apenas os trabalhadores dos sindicatos mais fortes, estão propagandeando uma grande mentira. É a legislação atual, ao garantir direitos trabalhistas básicos a todos, que impossibilita que os trabalhadores de categorias menos organizadas não sejam submetidos a níveis de exploração ainda maiores do que os que já vigoram hoje.
Por fim, a perversidade deste raciocínio mentiroso que ganhou forte repercussão midiática nos últimos dias, não é fruto exclusivo da cabeça dos comentaristas. Ambos estão submetidos a um interesse maior: a construção de uma narrativa que deslegitima os sindicatos como representantes da classe trabalhadora, repassando esta atribuição a um pequeno conjunto de supostos iluminados de gravata que abundam nas páginas dos grandes jornais e das televisões brasileiras. Estes mesmos sujeitos são aqueles que não falam uma vírgula sobre a elite rentista que consome quase 50% do orçamento público e sangra as contas do Estado brasileiro. Mas são os primeiros a defenderem a retirada de direitos dos trabalhadores para sair da crise. Ou seja, são verdadeiros “lobos em pele de cordeiro” que não falam pelos trabalhadores, como querem aparentar. Falam sim em nome de seus patrões, que lhes pagam gordos salários para vender a ideia de que os trabalhadores precisam pagar por uma crise que não criaram.
Florianópolis, 03 de março de 2016
Por Francisco Alano – Presidente da FECESC – Federação dos Trabalhadores no Estado de SC