Por José Álvaro de Lima Cardoso, economista e supervisor técnico do Dieese em Santa Catarina.
As multinacionais em geral, e as de petróleo em particular, estão exultantes com o governo que ajudaram a empossar. Recentemente, a estatal norueguesa Statoil, que adquiriu da Petrobrás a participação de 66% no campo Carcará, no pré-sal na Bacia de Santos, comemorava em seu site: “Por meio dessa aquisição, nós estamos tendo acesso a um ativo de primeira classe e fortalecendo nossa posição no Brasil, uma das áreas consideradas chave para a Statoil devido ao grande volume de recursos e à sintonia perfeita com nossas tecnologias e nossa capacidade de execução. O campo de Carcará irá aumentar significativamente os volumes produzidos internacionalmente pela Statoil a partir da década de 2020”. Cálculos conservadores dão conta que o poço adquirido por US$ 2,5 bilhões, deverão gerar para a Statoil US$ 10 bilhões de lucros. Negócio extraordinário para a empresa.
Em 27 de setembro, o presidente da Shell, Ben van Beurden, reuniu-se com Michel Temer e afirmou que o Brasil é um dos principais países de interesse para a petroleira investir. Segundo o executivo: “Não temos um anúncio ou um pedido a fazer, só viemos sublinhar a importância do Brasil para a empresa. A indústria do petróleo tem um tempo de vida muito grande e os investimentos são feitos pensando no longo prazo”.
Na prática as empresas estrangeiras de petróleo estão comemorando a temporada de vendas na Petrobrás e a abertura do mercado do pré-sal, que atende diretamente os interesses destes grupos.
A nova direção da Petrobrás, com sua política de privatização mal disfarçada, vem abrindo espaços crescentes para as multinacionais. O novo Plano de Negócios e Gestão 2017-2021 da Petrobrás prevê redução dos investimentos da empresa para os próximos cinco anos. O valor previsto para os investimentos no novo Plano, US$ 74,1 bilhões, significa uma redução de 25% em relação ao plano anunciado anteriormente (período de 2015 a 2019), que projetava investimentos de US$ 98,4 bilhões.
A anglo-holandesa Shell, que hoje comemora a possibilidade de acessar com grandes vantagens os já mapeados poços do pré-sal, devolveu ao governo brasileiro em 2001, uma área localizada na Bacia de Santos, sob o regime de Concessão. Justamente nessa área devolvida, nove anos depois, seria descoberta a maior jazida de petróleo do pré-sal, o poço gigante de Libra. A Shell desenvolveu poço exploratório que atingiu mil metros, mas desistiu, por não encontrar indícios importantes de petróleo. Nove anoso depois, ao nível de 6 mil metros, a Petrobrás descobriu uma jazida gigante de petróleo. Apesar da impressionante blindagem da mídia em relação às multinacionais, há indicações de que o equipamento utilizado pela multinacional era obsoleto e inadequado. A Shell informou que, naquela ocasião, a empresa não reconhecia o potencial do pré-sal. Pode-se imaginar o que diriam os entreguistas, se fosse a Petrobrás que tivesse devolvido o campo de Libra à Agencia Nacional de Petróleo e, posteriormente, uma multinacional verificasse no local a existência de uma jazida bilionária.
A capacidade tecnológica da Petrobrás é reconhecida em todo o mundo. O présal já responde por quase metade da produção nacional, mais de uma milhão de barris diários, resultado alcançado apenas após dez anos da descoberta destas jazidas, verdadeiro fenômeno na história do petróleo. O fato mostra a extraordinária produtividade do pré-sal: o primeiro milhão de barris diários de petróleo produzido pela Petrobras só foi atingido em 1998, quando a estatal tinha 45 anos de existência. O recorde foi atingido com a exploração de apenas 52 poços ativos, quando o primeiro milhão de barris diários foi alcançado com a exploração de mais de 8 mil poços produtores.
O custo de extração do barril no pré-sal, que vem sendo gradativamente reduzido nos últimos anos, passou de US$ 9,1 por barril de óleo equivalente (óleo + gás) em 2014, para US$ 8,3 em 2015, e, no primeiro trimestre deste ano, chegou a um valor inferior a US$ 8. Segundo a estatal, o custo médio da indústria oscila em torno dos US$ 15 por barril de óleo equivalente. Não é casual que o pré-sal seja um dos objetivos centrais do golpe de Estado em curso no Brasil. Essas jazidas possuem taxa de produtividade bastante superior à média mundial, operando com tecnologia de ponta e risco zero em cada poço, sendo economicamente viável a partir de um barril em torno de U$45/50.
É bastante possível que o encontro entre o presidente mundial da Shell, Bem van Beurden, e Michel Temer visou acertar detalhes da entrega do pré-sal à voracidade das multinacionais. A prioridade do governo no Congresso após as eleições municipais é alterar as leis que regem a exploração do pré-sal, em prejuízo da Petrobrás e dos interesses nacionais. Até o mundo mineral já sabe que a entrega do petróleo é o golpe dentro do golpe. O projeto que tira a obrigatoriedade da Petrobras ser a única operadora nos campos é de autoria de José Serra, que prometeu à Chevron acabar com o regime de Partilha. Há muito já se denuncia, sem repercussão quase nenhuma, que a legislação que regula a exploração do pré-sal seria uma das primeiras a ser guilhotinada. Do script previsto no processo golpista, esse capítulo foi sempre o mais evidente e o mais doloroso para aqueles que amam o Brasil.