É nisso que também acredita Ana Maria Romeiro, 50 anos, que há mais de uma década recicla fibras naturais, como sisal, bagaço de cana-de-açúcar, palha de milho e de bananeira para produzir papel artesanal, peças decorativas como luminárias, e agendas. Para ela, a versatilidade típica das mulheres é uma forte aliada.
“Desde cedo, a mulher aprende a gerenciar várias situações. Cuidamos da casa, da família, do nosso trabalho. A capacidade que desenvolvemos para dar conta de tantas coisas ao mesmo tempo acaba nos ajudando a gerir um negócio”, disse. Segundo ela, a renda obtida com a atividade ajuda a pagar as contas da casa, principalmente quando o marido, que é mestre de obras, não está trabalhando.
Para garantir o escoamento da produção, Ana Maria vende as peças na oficina de artesanato que montou, no Recanto das Emas, uma região administrativa do Distrito Federal (DF) e também participa de feiras em cidades vizinhas.
A diretora executiva do Instituto Patrícia Galvão, uma organização não governamental que atua em projetos de defesa dos direitos da mulher, Jacira Melo, também avalia que a capacidade da brasileira de conduzir bem seus próprios negócios está associada à formação cultural, uma vez que ela é treinada desde cedo para desempenhar bem tarefas variadas.
“As mulheres, em geral, são criadas para dar conta de cinco, seis coisas ao mesmo tempo, tendo de fazer bem todas elas. Assumimos os cuidados da casa, dos filhos, do trabalho, além dos interesses próprios e desenvolvemos essa capacidade de equilibrar inúmeras funções”.
Ela lembra que o empreendedorismo feminino também pode ser um aliado importante no combate à violência de gênero, uma vez que mulheres que geram renda têm mais possibilidades de abandonar seus agressores. “Sabemos que uma das principais causas para que o ciclo de violência doméstica não seja rompido é a dependência financeira [que essas mulheres] têm de seus companheiros”.
Para Jacira, o aumento no número de empreendedoras no Brasil na última década tem contribuído para a autonomia econômica e a realização profissional de muitas mulheres, mas também potencializa os desafios dessa parcela da população. Ela enfatizou que essa mulher, que além de empreendedora é, na maioria das vezes, a principal cuidadora dos filhos e da família, não conta com uma estrutura pública adequada, o que inclui oferta de creches e de serviços de saúde.
“Não raro, uma mãe precisa chegar a uma unidade de saúde ainda de madrugada em busca de atendimento para os filhos e só consegue sair no fim da manhã ou no início da tarde. Situações como essa dificultam seu desenvolvimento profissional”, acrescentou.
Jacira enfatizou que o crescimento do empreendedorismo feminino no país também evidenciou a aptidão das mulheres para atuar em setores historicamente dominados por homens. É o caso de Agda Oliver, 32 anos, proprietária da oficina Meu Mecânico, em Ceilândia, região administrativa do DF. Depois de ter se sentido lesada ao ser atendida em uma oficina tradicional onde só trabalhavam homens, ela decidiu investir em um estabelecimento voltado para o público feminino.
Segundo a ex-bancária, o charme do negócio vai além das paredes cor-de-rosa: inclui a oferta de diversos mimos à clientela, como vale maquiagem, manicure e academia.
“Sempre tive vontade de ter um negócio próprio e quando enxerguei essa oportunidade decidi mudar tudo. Meu rendimento ainda é menor do que na época do banco, mas tenho expectativa de continuar crescendo”, disse ela. Três anos depois de largar o antigo emprego em um banco e mergulhar na nova atividade, ela se diz orgulhosa do negócio inovador que, apesar da proposta inicial, também atrai clientes homens.
“Oferecemos um atendimento individualizado, com dicas por e-mail sobre o melhor uso do carro e alertas sobre a época em que se deve fazer um serviço, como a troca de óleo. Por isso, embora as mulheres sejam 80% de nossos clientes, muitos homens também nos procuram porque sabem que aqui o serviço é de qualidade”, explicou.
Dados da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada no ano passado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelam que as mulheres representam 31% dos cerca de 22,8 milhões de empreendedores no país. Embora tenha diminuído o número de mulheres nessa atividade entre as duas últimas edições da pesquisa, em 2011 elas somavam 7 milhões. Em relação a 2001, quando elas totalizavam 5,8 milhões, houve aumento de 20%. Naquele ano, as mulheres correspondiam a 29% do total de empreendedores no país.
Fonte: Revista Agência Brasil
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