Para entidade, acordo assinado nesta sexta é sentença de morte para indústrias da Região e representa muitos prejuízos para a classe trabalhadora
Em comunicado divulgado nesta sexta-feira (28), a Coordenadora de Centrais Sindicais do Cone Sul alerta que o acordo de livre comércio assinado entre o Mercosul e a União Europeia (UE) é uma sentença de morte para as indústrias da Região e, consequentemente, para a classe trabalhadora, tanto com relação a quantidade quanto a qualidade do emprego em ambas as regiões, além de resultar em situações imprevistas de deslocamento social (migrações do campo para a cidade, desemprego industrial em massa).
A nota também critica duramente a falta de transparência que envolveram as negociações e expressa preocupação com este acordo “que não leva em conta as sensibilidades de ambas as partes em termos de emprego e nem a necessidade de contribuir para um esquema de desenvolvimento simétrico e equilibrado das duas regiões”.
Outros pontos destacados na nota são os riscos que a “triangulação” de produtos desenvolvidos, principalmente, em países fora do acordo, onde os salários são muito baixos e os direitos trabalhistas mais básicos não são respeitados; e a questão dos serviços estratégicos para o desenvolvimento das nações, entre outros.
A Coordenadora de Centrais Sindicais do Cone Sul, encerra a nota lembrando que o movimento sindical do Cone Sul apresentou várias vezes para as autoridades de ambos os blocos as principais preocupações e demandas para que a negociação avançassem para um verdadeiro acordo de associação que permitisse fortalecer as relações políticas, sociais, econômicas e culturais entre ambas regiões, e que fosse capaz de promover o respeito aos direitos humanos, ao emprego digno, ao trabalho decente, ao desenvolvimento sustentável e aos valores democráticos.
“No entanto”, conclui, “não obtivemos as respostas esperadas, nem uma participação real e efetiva nas negociações, o que motiva nossa absoluta rejeição ao presente acordo, tanto em relação a suas formas quanto a seu conteúdo”.
Confira a íntegra da nota:
COMUNICADO DA COORDENADORA DE CENTRAIS SINDICAIS DO CONE SUL SOBRE O TRATADO DE LIVRE COMÉRCIO ENTRE O MERCOSUL E A UNIÃO EUROPEIA
Cone Sul, 28 de junho de 2019
Tendo em vista a assinatura do acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia (UE), a Coordenadora de Centrais Sindicais do Cone Sul alerta aos nossos povos sobre o impacto desastroso que este acordo terá para o sistema produtivo da região em geral, e para certos ramos estratégicos da produção em particular, tais como tecnologia, sistemas marítimos e fluviais, obras públicas, compras do Estado, laboratórios medicinais, indústria automotiva, economias regionais (especialmente aquelas ligadas ao azeite, vinhos e espumantes, queijos e produtos lácteos, entre outros), concluindo que a assinatura deste acordo é a sentença de morte de nossas indústrias e uma grande parte do nosso trabalho decente e emprego de qualidade.
Quanto às formas como o acordo está sendo negociado, somos obrigados a reiterar mais uma vez nossa profunda preocupação com a total falta de transparência e opacidade com as quais as negociações foram realizadas.
Quanto ao conteúdo, expressamos nossa preocupação legítima por um acordo que não leva em conta as sensibilidades de ambas as partes em termos de emprego e nem a necessidade de contribuir para um esquema de desenvolvimento simétrico e equilibrado das duas regiões. Especificamente, estamos preocupados, entre outros, com os seguintes pontos que consideramos extremamente sensíveis ao interesse social em geral e aos trabalhadores e trabalhadoras em particular:
Cobertura das ofertas e ritmo de redução das cestas de mercadorias: sabemos que a cobertura das ofertas é superior a 90%, o que indica que se trata de um acordo de livre comércio de natureza muito ampla, com liberalização quase total do comércio bi-regional. Além disso, foram negociadas acelerações ao ritmo de redução previstos, com a maioria do comércio bilateral permanecendo dentro de um período de redução tarifária de menos de 10 anos.
Acreditamos que tanto a amplitude da cobertura quanto a finitude dos períodos de redução ameaçam uma transição ordenada dos setores produtivos para uma situação de livre comércio birregional, o que poderia ter impactos substanciais tanto na quantidade quanto na qualidade do emprego em ambas as regiões, além de resultar em situações imprevistas de deslocamento social (migrações do campo para a cidade, desemprego industrial em massa).
Regras flexíveis de origem: sabemos que estão sendo negociadas regras “flexíveis” para determinar a origem dos produtos, a fim de poder usar insumos importados de países terceiros. Esta “flexibilidade” acarreta um alto risco de “triangulação” de produtos que são desenvolvidos principalmente em países fora do acordo, de salários muito baixos e onde os direitos trabalhistas mais básicos não são respeitados, e que com um processamento ou rotulagem mínimos podem desfrutar dos benefícios das preferências concedidas.
Serviços estratégicos para o desenvolvimento de nossas nações: estamos preocupados com a inclusão na negociação de alguns setores de serviços estratégicos para o desenvolvimento nacional, como o transporte marítimo e fluvial, serviços audiovisuais, serviços de energia e serviços financeiros.
Manutenção do poder de compra do Estado: Historicamente, o poder de compra e contratação do Estado nacional tem funcionado como uma ferramenta potente para o desenvolvimento industrial. É necessário manter esse poder por parte dos diferentes Estados nacionais em todos os níveis (nacional, estadual e municipal), especificamente no que diz respeito às obras públicas, e evitar conceder “tratamento nacional” às empresas dos países de ambas regiões.
Rejeição da extensão de patentes e a proteção dos dados de teste: a realidade mostra que o sistema de patentes no caso de medicamentos só serve para excluir do mercado novos competidores, pontualmente produtores públicos ou privados de medicamentos genéricos. Rechaçamos a inclusão de cláusulas de extensão de patentes e proteção de dados de teste no marco do capítulo sobre propriedade intelectual, com o objetivo de incentivar a produção local de produtos farmacêuticos e facilitar o acesso à saúde e a medicamentos para ambas as populações.
Fomento de setores produtivos específicos: todo acordo que pretende o desenvolvimento simétrico e equilibrado de todas as partes requer a existência de mecanismos que permitam um processo de reestruturação dos setores mais sensíveis e de fomento a novos setores produtivos geradores de empregos de qualidade e valor agregado. Um acordo com estas características requer a manutenção e inclusão de instrumentos tais como salvaguardas comerciais, cláusulas de indústria nascente, regimes suspensivos e licenças de importação, todos eles permitidos e regulados atualmente pela Organização Mundial do Comércio (OMC), que não seriam parte desta negociação.
Promoção de Pequenas e Médias Empresas (PMEs): embora saibamos que existem cláusulas específicas na negociação em matéria de PMEs, as mesmas se limitam a melhorar a circulação de informações técnicas e legais do acordo. Para beneficiar efetivamente do acordo, as PMEs necessitam de apoio financeiro e transferência de tecnologia para poder enfrentar positivamente um processo de abertura comercial, modernização tecnológica e melhoria de competitividade, elementos que não estão previstos na atual negociação.
Ausência de estudos completos de impacto: é essencial contar com estudos e de impacto que revelam os verdadeiros resultados do acordo. O Mercosul nem apresentou uma análise semelhante. Consideramos impróprio assinar um acordo com a magnitude do presente sem conhecer os resultados econômicos e sociais do mesmo em termos gerais, muito menos sem estimar o impacto na quantidade e qualidade do emprego.
Em suma, desde o movimento sindical do Cone Sul, repetidamente apresentamos para as autoridades de ambos os blocos nossas principais preocupações e demandas para que a negociação avance para um verdadeiro acordo de associação que permita fortalecer as relações políticas, sociais, econômicas e culturais entre ambas regiões, e que seja capaz de promover o respeito aos direitos humanos, ao emprego digno, ao trabalho decente, ao desenvolvimento sustentável e aos valores democráticos. No entanto, não obtivemos as respostas esperadas, nem uma participação real e efetiva nas negociações, o que motiva nossa absoluta rejeição ao presente acordo, tanto em relação a suas formas quanto a seu conteúdo.
Fonte: CUT Brasil | Escrito por: Redação CUT | Foto: Reprodução