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Os limites do capital são os limites da Terra

19/01/2009
Uma semana após o estouro da bolha econômico-financeira, no dia 23 de setembro, ocorreu o assim chamado Earth Overshoot Day , quer dizer, "o dia da ultrapassagem da Terra". Grandes institutos que acompanham sistematicamente o estado da Terra anunciaram: a partir deste dia o consumo da humanidade ultrapassou em 40% a capacidade de suporte e regeneração do sistema-Terra. Traduzindo: a humanidade está consumindo um planeta inteiro e mais 40% dele que não existe. O resultado é a manifestação insofismável da insustentabilidade global da Terra e do sistema de produção e consumo imperante. Entramos no vermelho e assim não poderemos continuar porque não temos mais fundos para cobrir nossas dívidas ecológicas. Esta notícia, alarmante e ameaçadora, ganhou apenas algumas linhas na parte internacional dos jornais, ao contrário da outra que até hoje ocupa as manchetes dos meios de comunicação e os principais noticiários de televisão. Lógico, nem poderia ser diferente. O que estrutura as sociedades mundiais, como há muitos anos o analisou Polaniy em seu famoso livro A Grande Transformação, não é nem a política nem a ética e muito menos a ecologia, mas unicamente a economia. Tudo virou mercadoria, inclusive a própria Terra. E a economia submeteu a si a política e mandou para o limbo a ética. Até hoje somos castigados dia a dia a ler mais e mais relatórios e análises da crise econômico-financeira como se somente ela constituisse a realidade realmente existente. Tudo o mais é secundarizado ou silenciado. A discussão dominante se restringe a esta questão: que correções importa fazer para salvar o capitalismo e regular os mercados? Assim poderíamos continuar as usual a fazer nossos negócios dentro da lógica própria do capital que é: quanto posso ganhar com o menor investimento possível, no lapso de tempo mais curto e com mais chances de aumentar o meu poder de competição e de acumulação? Tudo isso tem um preço: a delapidação da natureza e o esquecimento da solidariedade generacional para com os que virão depois de nós. Eles precisam também satisfazer suas necessidades e habitar um planeta minimamente saudável. Mas esta não é a preocupação nem o discurso dos principais atores econômicos mundiais mesmo da maioria dos Estados, como o brasileiro que, nesta questão, é administrado por analfabetos ecológicos. Poucos são os que colocam a questão axial: afinal se trata de salvar o sistema ou resolver os problemas da humanidade? Esta é constituída em grande parte por sobreviventes de uma tribulação que não conhece pausa nem fim, provocada exatamente por um sistema econômico e por políticas que beneficiam apenas 20% da humanidade, deixando os demais 80% a comer migualhas ou entregues à sua própria sorte. Curiosamente, as vitimas que são a maioria sequer estão presentes ou...

Réquiem por Israel?

14/01/2009
Está ocorrendo na Palestina o mais recente e brutal massacre do povo palestino cometido pelas forças ocupantes de Israel com a cumplicidade do Ocidente, uma cumplicidade feita de silêncio, hipocrisia e manipulação grotesca da informação, que trivializa o horror e o sofrimento injusto e transforma ocupantes em ocupados, agressores em vítimas, provocação ofensiva em legítima defesa. As razões próximas, apesar de omitidas pelos meios de comunicação ocidentais, são conhecidas. Em novembro passado a aviação israelense bombardeou a faixa de Gaza em violação das tréguas, o Hamas propôs a renegociação do controle dos acessos à faixa de Gaza, Israel recusou e tudo começou. Esta provocação premeditada teve objetivos de política interna e internacional bem definidos: recuperação eleitoral de uma coligação em risco; exército sedento de vingar a derrota do Líbano; vazio da transição política nos EUA e a necessidade de criar um facto consumado antes da investidura do presidente Obama. Tudo isto é óbvio mas não nos permite entender o ininteligível: o sacrifício de uma população civil inocente mediante a prática de crimes de guerra e de crimes contra a humanidade cometidos com a certeza da impunidade. É preciso recuar no tempo. Não ao tempo longínquo da bíblia hebraica, o mais violento e sangrento livro alguma vez escrito. Basta recuar sessenta anos, à data da criação do Estado de Israel. Nas condições em que foi criado e depois apoiado pelo Ocidente, o Estado de Israel é o mais recente (certamente não o último) ato colonial da Europa. De um dia para o outro, 750.000 palestinos foram expulsos das suas terras ancestrais e condenados a uma ocupação sangrenta e racista para que a Europa expiasse o crime hediondo do Holocausto contra o povo judeu. Uma leitura atenta dos textos dos sionistas fundadores do Estado de Israel revela tudo aquilo que o Ocidente hipocritamente ainda hoje finge desconhecer: a criação de Israel é um ato de ocupação e como tal terá de enfrentar para sempre a resistência dos ocupados; não haverá nunca paz, qualquer apaziguamento será sempre aparente, uma armadilha a ser desarmada (daí, que a seguir a cada tratado de paz se tenha de seguir um ato de violação que a desminta); para consolidar a ocupação, o povo judeu tem de se afirmar como um povo superior condenado a viver rodeado de povos racialmente inferiores, mesmo que isso contradiga a evidência de que árabes e judeus são todos povos semitas; com raças inferiores só é possível um relacionamento de tipo colonial, pelo que a solução dos dois Estados é impensável; em vez dela, a solução é a do apartheid, tanto na região, como no interior de Israel (daí, os colonatos e o tratamento dos árabes israelenses como cidadãos de segunda classe);...

A água (que ninguém vê) na guerra

12/01/2009
Para além das manchetes do conflito do Oriente Médio, há uma batalha pelo controle dos limitados recursos hídricos na região. Embora a disputa entre Israel e seus vizinhos se concentre no modelo terra por paz, ‘há uma realidade histórica de guerras pela água’ – tensões sobre as fontes do Rio Jordão, localizadas nas Colinas de Golã, precederam a Guerra dos Seis Dias". Raymond Dwek – The Guardian, [24/NOV/2002] * A nossa sobrevivência na Terra está ameaçada. Sem alimento, o ser humano resiste até 40 dias; sem água, morre em 3 dias. Somos água! Mas, enquanto a população se multiplica e a poluição recrudesce, as fontes de água desaparecem. Na guerra do momento – Israel em Gaza -, por que a mídia não fala sobre a água – um dos itens mais importantes dos conflitos no Oriente Médio? Oriente Médio… uma região aonde água vale mais do que petróleo… E sempre nos passam a idéia de que lá as guerras ocorrem pela conquista das reservas de petróleo. E a conquista das reservas de água? Em 1997, o então vice-diretor geral da UNESCO, Adnan Badran, no seminário "Águas transfronteiriças: fonte de paz e guerra" (que centrou os debates nas águas do Mar Aral, do rio Jordão, do Nilo…) disse que "a água substituirá o petróleo como principal fonte de conflitos no mundo". Embora Israel tenha sérios problemas com recursos hídricos, detém o controle dos suprimentos de água, tanto seus como da Palestina. Além de restringir o uso d’água, luta pela expansão do seu território para obter mais acesso e controle deste recurso natural. Ali, ele é o "dono" das: – águas superficiais: bacia do rio Jordão (incluindo o alto Jordão e seus tributários), o mar da Galiléia, o rio Yarmuk e o baixo Jordão; – águas subterrâneas: 2 grandes sistemas de aqüíferos: o aqüífero da Montanha (totalmente sob o solo da Cisjordânia, com uma pequena porção sob o Estado de Israel), aqüífero de Basin e o aqüífero Costeiro que se estende por quase toda faixa litorânea israelense até Gaza. Tais águas são ‘transfronteiriças’, recursos naturais compartilhados. Segundo recente inventário da UNESCO, 96% das reservas de água doce mundiais estão em aqüíferos subterrâneos, compartilhados por pelo menos dois países. Há regras internacionais para o uso dessas águas. Algumas destas obrigam Israel a fornecer água potável aos palestinos. Mas Israel não compartilha a água; afinal, tais regras internacionais não prevêem mecanismos de coação ou coerção; é letra morta. O Tribunal Internacional de Justiça, até hoje, condenou apenas um caso relacionado com águas internacionais. A estratégia de Israel é outra. Em 1990, o jornal Jerusalém Post publicou que "é difícil conceber qualquer solução política consistente com a sobrevivência de Israel que não envolva o...

A dor que nunca passa

16/12/2008
Nos anos 1970, quando abriam a BR-364 no Acre, ela cortou ao meio o Seringal Bagaço, onde eu morava com minha família. À derrubada da mata seguiu-se uma epidemia violenta e incontrolável de sarampo e malária. Era gente doente ou morrendo em quase todas as casas. Perdi um primo e meu tio Pedro Ney, que foi uma das pessoas mais importantes da minha infância. Morreu minha irmã de quase dois anos e, quinze dias depois, outra irmã, de seis meses. Seis meses depois, morreu minha mãe. Tudo era avassalador, assustador. Uma dor enorme, extrema, que nunca passou. Para sair disso, tivemos que reconstruir, praticamente, o sentido inteiro do mundo. Aceitar o inaceitável, mas carregá-lo para sempre dentro de si. Ir em frente, enfrentar a dureza do cotidiano, sobreviver, cuidar dos outros. Viver, enfim, e dar muito valor à vida e às pessoas. Em 1985, numa das maiores enchentes do rio Acre em Rio Branco , eu morava no bairro Cidade Nova, na periferia da cidade, numa pequena casa de onde tivemos que sair às pressas, levando o que foi possível numa canoa. O resto foi levado pelas águas, inclusive o único retrato que tínhamos de minha mãe. Penso agora nisso tudo e acho que consigo entender o que sentem os catarinenses, mas ainda estou longe de alcançar o significado estarrecedor de uma perda tão total e instantânea como a que sofreram. Na escuridão, o morro descendo, destruindo tudo, a busca desesperada pelos filhos, a impotência. E, depois, descobrir-se só em meio ao caos: acabou a casa, foram-se as pessoas amadas, o lugar no mundo. Não há mais nada, só a vida física e a força do espírito. Meus filhos andam pela casa com todo vigor, com toda a beleza da juventude, e sequer consigo imaginar o que seria, de uma hora para outra, vê-los engolidos pela terra, debaixo de toneladas de escombros ou mutilados para o resto da vida. É algo terrível demais até no plano da imaginação. Fere a própria alma tão fundo que chega a ser impossível entender plenamente a profunda tristeza de quem enfrenta essa realidade. Na Londres de 1624, os sinos da catedral de São Paulo, onde o poeta John Donne era o Deão, tocavam quase ininterruptamente anunciando as milhares de mortes causadas pela peste. Atingido por grave enfermidade (que chegou a ser confundida com a peste) Donne escreveu então um de seus textos mais conhecidos, a Meditação XVII: "Nenhum homem é uma ilha, sozinho em si mesmo; cada homem é parte do continente, parte do todo; se um seixo for levado pelo mar, a Europa fica menor, como se fosse um promontório, assim como se fosse uma parte de teus amigos ou mesmo tua;...

Diário da Nova China: o gato e o rato

15/12/2008
Parto para minha primeira viagem à China, a um seminário que comemora os 30 anos do começo da política de Reforma e Abertura, iniciada em 1998, a que foram convidados 17 intelectuais estrangeiros, quase todos dos EUA e da Europa. Os chineses comemoram, em grande estilo, o sucesso de um processo que já ocupa mais tempo na história da Revolução Chinesa do que o período anterior – 1949-1998 -, marcado pela direção de Mao-Tse-Tung. Claro que a figura de Mao se projeta sempre muito acima das dos outros dirigentes posteriores, tanto porque dirigiu o processo revolucionário chinês desde a Grande Marcha, no começo dos anos 1930, como, além disso, porque dirigiu o povo chinês nas lutas que levaram à derrota dos ocupantes japoneses e norte-americanos, desembocando na vitória revolucionário de 1949. Porém, dois anos depois da morte de Mao, Deng-Ziao-Ping assombrava o mundo – e especialmente a esquerda, ainda mais a maoísta – com a declaração que abria este período: “Não importa a cor do gato, contanto que ele cace o rato”. A referência era claramente ao uso da tecnologia. Aqueles sentimentos eram ainda mais fortes, porque a declaração se situava em contradição mais antagônica possível com os princípios que haviam norteado a Revolução Cultural, viva até poucos anos antes. Esta se caracterizava, entre outros aspectos, pela tentativa de desmistificação do suposto caráter neutro e não classista da tecnologia, da ciência, da cultura e de toda forma de saber. Essa nova abordagem da tecnologia apontava para destravar o seu uso, na busca de acelerar o desenvolvimento econômico. Evidenciava também que terminava de forma peremptória o período da Revolução Cultural e que o novo período não apenas virava aquela página conturbada da histórica chinesa, mas que a negaria nos seus fundamentos mesmos. Hoje os chineses comemoram a data de 1978 como uma nova fundação da revolução, de que pretendem apresentar as conquistas espetaculares com orgulho. Os dados são todos impactantes, seja do crescimento do produto interno bruto, da renda per capita, da retirada de centenas de milhões de pessoas da zona de pobreza, da expansão do comércio exterior, da acumulação de divisas, do acesso de milhões de pessoas a bens de consumo básicos e modernos, dos níveis de escolaridade, do ritmo de investimentos, da construção de casas e prédios, da projeção, enfim, da China, como a segunda potência econômica do mundo. Os chineses afirmam seu direito a sair da situação de pobreza e mesmo de miséria em que viveram por um bom tempo a avançam para reverter a situação de inferioridade econômica que passaram a ter nos dois últimos séculos. Até o século XVIII, a China, mais avançada que a Europa ocidental, exportava seus produtos para esta – especiarias, seda,...

Querido Artur

11/12/2008
Perdoe-nos por fazer um menino de apenas quatro anos querer fugir de verdade para outro planeta. Essa vontade deveria fazer parte apenas de suas fantasias, do mundo do faz-de-conta, de aventuras onde você fosse o herói. E não a vítima. Acho que falo em nome de todos os adultos quando lhe peço desculpas. Li sua frase no jornal e quis escrever-lhe esta carta. Espero que leiam para você. Mas espero também que muitos outros a leiam. Artur, seu lugar é aqui na terra. Você é muito importante para todos nós, pois aos quatro anos já está ajudando a mudar nosso planeta. Sua frase talvez seja um alerta muito mais forte do que o de todos os especialistas juntos. Porque vem de alguém que deveria estar recebendo do mundo apenas a oportunidade de brincar e sonhar. E que no máximo só poderia sentir medo de algum lobo mau, que sempre perde no fim. Você mexe com a gente e nos faz pensar, porque com sua frase nos sentimos como bichos-papões de verdade. Numa história em que, no fim, quem perde com tanta ganância é o mundo todo. E principalmente crianças lindas como você. Mas Artur, felizmente essa história tem muito mais pessoas como você. Veja quanta gente, de todo Brasil e até de fora, está ajudando Santa Catarina! E são muitos, mas muitos mesmo, os que querem mudar o mundo. Por tudo isso, não é hora de desistir, não. A terra é como aquele brinquedo que estragou, mas tem conserto. Como o lego que desmontou, mas pode ser remontado com outra forma, muito mais bonita. Pode ter certeza que é por existir muitas pessoas como você, Artur, que essa história não acabou. Por mais que você esteja triste, eu lhe peço um favor: não deixe de brincar, nunca pare de sonhar. Nas suas brincadeiras e sonhos, invente um planeta diferente aqui mesmo na terra. Faça um desenho desse mundo melhor que você deseja. Eu gostaria de vê-lo. Seria uma inspiração para nós, adultos, torná-lo realidade. E assim, devolver a você o que nunca lhe deveríamos ter tirado: a esperança. Autor: Ideli Salvatti – Senadora...

Oxalá!

10/11/2008
Barack Obama, primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos, concretizará o sonho de Martin Luther King ou o pesadelo de Condoleezza Rice? Esta Casa Branca, que agora é sua casa, foi construída por escravos negros. Oxalá ele não se esqueça disso, nunca.  Obama provará no governo que suas ameaças de guerra contra o Irã e o Paquistão não foram mais do que palavras, proclamadas para seduzir ouvidos difíceis durante a campanha eleitoral? Oxalá. E Oxalá não caia por nenhum momento na tentação de repetir as façanhas de George W. Bush. Ao fim e ao cabo, Obama teve a dignidade de votar contra a guerra do Iraque, enquanto o Partido Democrata e o Partido Republicano ovacionavam o anúncio dessa carnificina. Durante sua campanha, a palavra “leadership” foi a mais repetida nos discursos de Obama. Durante seu governo, continuará crendo que seu país foi escolhido para salvar o mundo, tóxica idéia que compartilha com quase todos seus colegas? Seguirá insistindo na liderança mundial dos Estados Unidos e na sua messiânica missão de mando? Oxalá esta crise atual, que está sacudindo os cimentos imperiais, sirva ao menos para dar um banho de realismo e de humildade a este governo que começa. Obama aceitará que o racismo seja normal quando exercido contra os países que seu país invade? Não é racismo contar um por um os mortos dos invasores no Iraque e ignorar olimpicamente os muitíssimos mortos entre a população invadida? Não é racista este mundo onde há cidadãos de primeira, segunda e terceira categoria, e mortos de primeira, segunda e terceira? A vitória de Obama foi universalmente celebrada como uma batalha ganha contra o racismo. Oxalá ele assuma, a partir de seus atos de governo, esta formosa responsabilidade. O governo de Obama confirmará, uma vez mais, que o Partido Democrata e o Partido Republicano são dois nomes de um mesmo partido? Oxalá a vontade de mudança, que estas eleições consagraram, seja mais do que uma promessa e mais que uma esperança. Oxalá o novo governo tenha a coragem de romper com essa tradição de partido único, disfarçado de dois partidos, que, na hora da verdade, fazem mais ou menos o mesmo ainda que simulem uma disputa entre eles. Obama cumprirá sua promessa de fechar a sinistra prisão de Guantánamo? Oxalá, e Oxalá acabe com o sinistro bloqueio a Cuba. Obama seguirá acreditando que está certo que um muro evite que os mexicanos atravessem a fronteira, enquanto o dinheiro passa livremente sem que ninguém lhe peça passaporte? Durante a campanha eleitoral, Obama nunca enfrentou com franqueza o tema da imigração. Oxalá a partir de agora, quando já não corre o risco de espantar votos, possa e queira acabar com esse muro, muito...

As condições do Brasil para o enfrentamento da crise financeira

03/11/2008
Pela gravidade e intensidade da crise financeira internacional e pela sua capacidade de se espalhar pela economia mundial, não existe país que possa se considerar blindado em relação aos seus efeitos. Mas alguns aspectos da política econômica e comercial do Brasil fornecem ao país certa capacidade de enfrentamento dos efeitos da crise ao nível internacional. Um primeiro aspecto mais importante é a menor dependência das exportações brasileiras para os Estados Unidos que reduziu-se de 24,7% em 2001 para os atuais 15%. Em contrapartida aumentou os volumes para países da periferia capitalista em todo o mundo, o que deve atenuar os efeitos da crise sobre o país. De qualquer forma é importante considerar que o efeito desta redução é pequeno na medida em que, no período, o Brasil elevou as participações da China e do México como destino das exportações brasileiras, países de que dependem significativamente do mercado dos Estados Unidos. Um segundo aspecto relevante é o nível das reservas cambiais existentes no país, superior a US$ 200 bilhões. Um dos principais canais de transmissão da crise financeira internacional para o a economia do país tem sido a falta de crédito para a exportação. Na medida em que os bancos ficaram sem acesso aos fundos de crédito externo, eles diminuíram o repasse para as empresas exportadoras. Para contornar este problema, dentre outras medidas, o Banco Central tem colocado dinheiro das reservas à disposição dos bancos, para que estes repassem aos exportadores, no máximo em 30 dias. O governo já utilizou uma pequena parte das reservas para garantir a liquidez do mercado de câmbio e tem declarado estar disposto a investir o que for preciso para garantir crédito para as exportações. Um aspecto fundamental para o enfrentamento da crise, é o atual dinamismo do mercado interno, que tem sido o motor do crescimento da economia brasileira nos últimos trimestres. A economia tem crescido com base na expansão do consumo das famílias e a taxa de crescimento dos investimentos vem expandindo o dobro do consumo. Este processo deve amortecer os impactos da crise financeira internacional sobre a economia brasileira. Um fator extremamente positivo é a situação da dívida pública, que vem caindo nos últimos anos em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). Com a depreciação do real ocorrida a partir de setembro a dívida pública vem caindo, o oposto do que ocorreu em outras crises cambiais. Nas crises anteriores quando a taxa de câmbio se desvalorizava, como a dívida pública era, em boa parte, indexada ao câmbio o Estado ficava insolvente, praticamente quebrando e tendo que recorrer a empréstimos nos mercados internacionais. No mês de setembro, como o país é credor em moeda estrangeira e o dólar se valorizou frente ao real,...

Um dia na vida da Folha de S. Paulo

03/11/2008
O dia é quinta, 30 de Outubro de 2008. Mas podia ser qualquer outro. Nessa quinta, o desprezo da Folha pelos seus leitores superou-se com a reportagem “Luz para Todos não cumpre a meta de dois milhões". Minha mulher, que já vinha se aborrecendo com a Folha, fechou as páginas, irritada: “Esse jornal pensa que somos idiotas”. Começa pela foto que encima a história, uma cena de escuridão no Congresso Nacional, que não tem nada nadinha a ver com o programa Luz para Todos. Depois vem o título, enorme, em quatro colunas, numa página nobre do jornal, chamando de fracassado um programa que os números da reportagem revelam estar sendo um dos maiores sucessos do governo Lula. O Luz para Todos atingiu até a semana anterior à publicação da matéria, nada menos que 1, 744 milhão de famílias. São famílias, por definição, localizadas em regiões remotas, pequenos vilarejos que as concessionárias não serviam por não ser econômico. Mesmo se ficasse só nisso, já seria um feito excepcional. Não só pelo número absoluto de famílias e comunidades beneficiadas, mas também pelo fato de quase 90% da meta ter sido alcançada – meta essa que já era bastante ambiciosa. Foi tão forte o desejo de narrar um fracasso que o repórter excluiu do seu argumento sobre o não cumprimento da meta deste ano o fato relevante de que o ano ainda não terminou. Só lá em baixo, no pé da reportagem, separadas propositalmente do argumento principal da narrativa, está a informação de que já há mais R$ 13 bilhões em contratos fechados, sendo R$ 9,4 bilhões do governo federal, R$ 1,6 bilhão dos governos estaduais e R$ 1,9 bilhão das concessionárias. O sucesso é tanto que o Ministério de Minas e Energia já pensa em ampliar a meta em mais 1,1 milhão de famílias entre 2009 e 2010. (1) Na mesma edição, a Folha relata outro retumbante “fracasso” do governo Lula. “Gastos do governo com o PAC caem 70%”. O título é de quatro colunas ocupando também o topo de página. Um gráfico de pagamentos do PAC revela investimentos crescentes ao longo do ano, exceto pequena redução em junho, e as quedas que deveriam justificar o título, em setembro e outubro. De pronto está a desonestidade do título. Gastos só caíram nos últimos dois meses. E mais: caíram de forma brusca. A explicação está lá, escondida, no meio da própria reportagem: as chuvas de setembro e a greve dos servidores do Departamento Nacional de Infra-estrutura (DNIT) que “bloqueou pagamentos e todas as demais fases da gastos durante três semanas…” (2). Um título mais preciso seria na linha de ”greve paralisa obras do PAC”. Mas esse título não serviria ao propósito aparente...

Os três passos políticos para enfrentar a crise, segundo a ONU

31/10/2008
A comunidade global deve reconhecer que num mundo interdependente, país algum pode agir isoladamente. Não é possível para todos os países gerarem mais superávit primário ou melhorar sua competitividade internacional ao valorizar sua moeda ou cortar custos. O avanço de uma nação é o recuo de uma outra. A cooperação global e a regulação são imperativas. A Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad) sugere três passos iniciais para isso. Unctad – Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento Relatório político n° 4 da Unctad (Outubro/2008) Com os mercados do mundo absorvendo as primeiras ondas da continuidade da crise financeira, a atenção se volta para as maneiras de administrar coletivamente o desenrolar do desequilíbrio global e para prevenir a turbulência sistêmica. Isso é algo que a UNCTAD tem advogado mesmo durante a exuberância irracional gerada pela especulação ilimitada. Num mundo interconectado, nenhum país pode agir isoladamente – um princípio que tem estado no coração da mensagem de interdependência da UNCTAD, desde sua origem e que não pode ser mais apropriado, nestes dias. Este relatório político argumenta que a cooperação global e a regulação são imperativos tanto no comércio como na finança, e que a ONU é a organização internacional com mais crédito para liderar o projeto, a discussão e para reunir esses esforços. Grandes problemas nos mercados locais A crise financeira continua a se espalhar pelas regiões, países e setores de atividade, a despeito das medidas desesperadas tomadas pelos governos para conter o lixo tóxico e prevenir o contágio. Mas, parar o processo de desaceleração global revelou-se difícil, enquanto as posições especulativas de milhões de lares e companhias se desenrolam num número importante de mercados. O choque da proximidade de um derretimento no sistema financeiro norte-americano e noutros sacudiu profundamente a crença segundo a qual os negócios iriam rapidamente voltar aos mercados; e as expectativas de que a geração de capital pode ocorrer sem assumir riscos excessivos nos investimentos desapareceu. A desaceleração é claramente tão necessária como inevitável. Quando as posições especulativas tiverem se aclarado, os preços vão, na maioria dos casos, ser melhor alinhados com os fundamentos sustentados na oferta e na demanda. Contudo, os efeitos de curto prazo do giro de preços e no câmbio não deve ser subestimado. Em muitos casos as economias familiares e empresariais podem provavelmente ajustar com facilidade seus balancetes, reduzindo sua exposição a altos riscos e a obrigações de dívida – presumindo que têm tempo suficiente para fazê-lo. Se, por outro lado, o preço das ações ou a taxa de câmbio lhes for prejudicial, num curto intervalo de tempo essas mesmas economias podem ser jogadas na inadimplência. O fogo que os governos estão apagando atualmente implica,...

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