Entre os emergentes o Brasil é um dos países que ainda está se saindo bem no quadro
internacional. Entre o chamado BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) a Rússia é o país mais
afetado pela crise. A produção industrial do país recuou 20% em janeiro e as estimativas
oficiais para o Produto Interno Bruto (PIB) de 2009 foram recentemente revistas para -2,2%. O
país já queimou US$ 200 bilhões das suas reservas tentando deter a queda do rublo e setores
do governo pressionam por um controle de câmbio para estancar a fuga de capitais. Os países
emergentes asiáticos também sofrem duramente a crise. A Coréia do Sul teve queda do PIB
em 5,6% no último trimestre de 2008. Após a maior queda das exportações de sua história em
janeiro, de 17,5%, a estimativa é que a China cresça 7,4% em 2009. A Índia sofrerá também,
mas a previsão oficial é ainda de um crescimento de 5,6% para 2009, ótimo desempenho
considerando o crescimento da economia mundial no ano.
Em termos comparativos, o comportamento da economia brasileira até o momento é razoável. Conforme tem sido destacado por vários analistas, alguns fundamentos da economia brasileira tem sido determinantes na capacidade de o país enfrentar a crise sem quebrar, após o seu agravamento, a partir de setembro de 2008. São eles:
a) menor dependência do mercado consumidor dos Estados Unidos, centro da crise;
b) nível das reservas cambiais existentes no país, em torno de US$ 200 bilhões;
c) o dinamismo do mercado interno, que tem sido o motor do crescimento da economia
brasileira nos últimos trimestres;
d) desempenho do mercado de trabalho, com queda da taxa de desemprego nas Regiões
Metropolitanas e crescimento da renda (até novembro);
e)situação da dívida pública, que vem caindo nos últimos anos em relação ao PIB, e que hoje
está em 36% do PIB;
f) nível de depósitos compulsórios, um dos instrumentos que o Banco Central usa para
controlar a quantidade de dinheiro que circula na economia;
g) as obras do PAC, que contribuíram para acelerar o crescimento em 2008, vêm sendo
executadas, e tem papel fundamental nas áreas de investimentos em infra-estrutura,
estímulo ao crédito e ao financiamento, melhora do ambiente de investimento, desoneração
e aperfeiçoamento do sistema tributário e medidas fiscais de longo prazo.
Passado seis meses do processo de agravamento da crise internacional, já com os países desenvolvidos em recessão, a constatação é que a maioria dos itens relacionados acima tem ajudado o Brasil a enfrentar a crise (com exceção do mercado de trabalho, que se deteriorou bastante a partir de dezembro). Alguns sintomas reforçam essa constatação. O risco Brasil, por exemplo, caiu de 473 pontos na média de novembro para 430 pontos em 20/02/09, apesar do agravamento da crise internacional desde então e da sucessão de péssimas notícias na economia global. Um fato também relevante é que as reservas se mantêm praticamente intactas, na casa dos US$ 200 bilhões, desde então.
Nos próximos dias outra importante medida de combate à crise deve ser anunciada pelo governo federal: o pacote de combate ao déficit habitacional, que prevê investimentos de R$ 100 bilhões em dois anos, dos quais a metade deverá ser liberada ainda em 2009. Segundo o que já veiculou na mídia a meta do governo é construir 1 milhão de casas ao longo de 2009 e 2010, no valor de R$ 100 mil cada. Um investimento desta magnitude exercerá fortes efeitos nos setores siderúrgicos, de cimento e metalúrgico, gerando demanda para equipamentos pesados e insumos para a construção civil (cimento, tubos, ferro, madeira, areia, etc.). Segundo informações divulgadas pelo Ministério da Fazenda, desde 1974, o déficit habitacional no país é de 7,4 milhões, o que revela a ambição do pacote governamental. Em 2008 foram financiados aproximadamente 500 mil imóveis no Brasil, só que, de imóveis novos, foram financiados aproximadamente 260 mil.
As medidas veiculadas até o momento compõem um conjunto ousado de enfrentamento da crise conjuntural, ao mesmo tempo em que mexe em uma ferida de natureza estrutural no Brasil, o déficit habitacional. Se o pacote habitacional migrar rapidamente do plano dos desejos para a vida real, pode fazer muita diferença no enfrentamento das dificuldades que 2009 reserva aos brasileiros.
Autor: José Álvaro de Lima Cardoso – Economista e supervisor técnico do DIEESE em SC