Em audiência na Câmara dos Deputados, jornalista defendeu a liberdade de imprensa e disse ter ficado “chocado” e “decepcionado” quando soube das relações de Moro com Dallagnol
“Em qualquer país democrático, se algum juiz fizesse o que Moro fez, receberia punição. Com certeza perderia seu cargo e seria proibido de exercer a advocacia. É impensável um juiz agir assim”, disse o jornalista Glenn Greenwald, do The Intercept Brasil, que esteve hoje (25) na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados para detalhar o escândalo por ele divulgado conhecido como Vaza Jato. Glenn e sua equipe de jornalistas tiveram acesso a extenso material que comprova que o ministro Sergio Moro, quando era juiz em Curitiba, atuou como chefe de procuradores do Ministério Público responsáveis pela Operação Lava Jato. Isso coloca em xeque sua parcialidade como juiz, assim como prisões importantes, como a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Hoje, Moro é ministro da Justiça e Segurança Nacional do governo Bolsonaro. Moro teria atuado ideologicamente para prejudicar o PT, além de outras irregularidades. “Quando recebi os materiais, fiquei chocado. Antes de ser jornalista, atuava como advogado nos Estados Unidos. Fiquei chocado em como um juiz estava colaborando não às vezes, mas o tempo todo, em segredo, sem conhecimento do outro lado”, disse Glenn, que é especialista em Direito Constitucional.
O jornalista fez questão de compartilhar com muitos especialistas o material. Ele recebeu indignação de volta. “A primeira coisa que fiz foi consultar especialistas na lei brasileira. Professores, juristas e advogados. Procurei aqueles sem perspectivas políticas fortes, para entender se eu estava certo. Todos os professores, especialistas que olharam para esse material, reagiram da mesma forma. Não só chocados, mas indignados como advogados. Chocados e indignados sobre como esse material mostra um abuso do poder judiciário tão severo.”
- “É impossível, em uma democracia, Moro ocupar um cargo público tão grande como ministro”
Papel do jornalista
Além de compartilhar com especialistas, Glenn reiterou sua parceria com outros veículos. Algo incomum, o The Intercept Brasil abriu os “furos” de reportagem para outras mídias, como a Folha de S.Paulo e a BandNews FM. Isso foi feito porque se trata de algo importante para a democracia brasileira, defende Glenn. “Abrimos acesso, isso é muito raro, convidamos outros veículos da mídia, de todas as ideologias, para examinar e reportar conosco. Então, o partido do governo vai falar que a Folha de S.Paulo que apoiou o impeachment é porta-voz do PT? O partido do governo vai falar que Reinaldo Azevedo (da BandNews FM) é comunista e defende Lula ou Dilma?”
Enquanto isso, Moro e a base bolsonarista seguem atacando Glenn. Dizem que é criminoso por exercer sua liberdade de imprensa. “É o papel do jornalista em uma democracia. Muitos perguntam como podemos publicar documentos obtidos ilegalmente. Antes de mais nada, quem alega isso está especulando. Inclusive Moro, que admite que não sabe como a fonte pegou os documentos. Ele fala de hacker, crime organizado, mas quando pedem evidências, ele diz estar apenas especulando. Mas não tem importância para o jornalista o que a fonte fez. Isso no mundo democrático”, disse.
“Nosso papel, como jornalistas, é informar o público, reportar material de interesse público. Tudo que fazemos com material e arquivo, é com apenas um motivo: informar o público, para assim fortalecer, não enfraquecer, a luta contra a corrupção”, completou.
“É impossível lutar contra a corrupção usando de comportamento corrupto”
No início da semana, Moro esteve no Senado para ser ouvido sobre o caso. “Quando Moro foi no Senado, a tática dele foi fingir que tinha doença, ou pior memória da história da humanidade. Ele disse que não podia reconhecer isso ou aquilo. Ele admitiu, neste caso, que fez sugestões para construir a acusação. Esse é o ponto mais importante”, disse Glenn, ao defender que a Lava Jato estava envolta em corrupção.
Ameaças
Glenn revelou estar sofrendo graves ameaças e, apesar de ser norte-americano, se recusa a sair do país. Prefere a defesa da verdade. “Estamos recebendo muitas ameaças graves, com muitos dados privados sobre nossa família, filhos, nossa casa. O tipo de ameaça que Jean Wyllys estava recebendo. Mas, ameaça mais grave do que a de morte, é a que está vindo do próprio Moro. O tempo todo, Moro nos chama de “aliados dos hackers” (…) A intenção de Moro é muito óbvia. Ele tenta nos ameaçar, nos intimidar e nos criminalizar.”
“Tenho passaporte norte-americano. Nossos filhos têm direito ao passaporte norte-americano. Podemos sair do país a qualquer minuto. Se eu tivesse o mínimo envolvimento com as fontes para pegar documentos, acha que eu ficaria aqui? Eu poderia sair e publicar de fora, mas estou aqui e aqui vou ficar”, completou.
Fonte: CUT Brasil | Escrito por: Redação RBA | Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil