A grande imprensa tem apresentado a crise na Ucrânia como uma luta por democracia e pela sua independência em relação à Rússia, resultante da divisão interna do País entre pró-russos e pró-europeus. Reduz a polêmica, assim, a um enfrentamento entre os europeus democráticos e os russos tiranos, ignorando e escondendo o conflito de interesses entre os Estados Unidos e aliados em relação à Rússia e à China.
Como destaca José Arbex Jr., “cerca de 75% da população mundial vivem na Eurásia, que possui a maior parte dos recursos naturais do planeta. Ali estão 60% do PIB do planeta e cerca de 75% de suas reservas conhecidas de energia. Depois dos EUA, as outras seis maiores economias e os seis maiores investidores em armas estão localizados na Eurásia”.
O que está em jogo, na Ucrânia, diz ele, “é o fim da Rússia como potência regional euroasiática”, pois “quem controlar a Eurásia, controlará o mundo no século”, lembrando que a Rússia “é o País que liga a Europa à Ásia, é dona de vastos recursos naturais e é uma potência nuclear” e a sua queda abre “caminho para o controle da Eurásia”.
Para José Arbex Jr., “em termos econômicos, o nome do jogo é Traceca, composto com as iniciais em inglês, de Corredor de Transporte Europa – Cáucaso – Ásia Central”, formado por “um complexo rodoferroviário destinado a ligar a Europa mediterrânea até a China, passando pelo Afeganistão e Turquia”.
Lembra ele que, “em termos geoestratégicos, o Afeganistão está destinado a ocupar um lugar central na economia do Traceca, como região de passagem e contato entre o extremo asiático, o Oriente Médio e a Europa. Daí a invasão do País em 2001; que não teve nada a ver com Osama Bin Laden”.
A China, como potência mundial, também tem muito interesse no desenvolvimento do Traceca, razão pela qual os Estados Unidos tentam isolá-la, aproximando-se do Japão e formando “novos tratados comerciais com países do Pacífico que excluem a China”.
Segundo José Arbex Jr., “a perda de controle russo sobre a Crimeia e o porto de Sebastopol, que garante a Moscou uma saída para o Mediterrâneo – transformaria a Rússia numa potência de segunda categoria. É isso que explica a crise da Ucrânia. Os estrategistas do Pentágono fomentaram e estimularam movimentos separatistas na Ucrânia, mas também na Tchetchênia e na Geórgia”.
Miguel Ángel Barrios cita denúncia de Luiz Alberto Moniz Bandeira, segundo a qual existe “ação de algumas Organizações Não Governamentais (ONGs) e fundações estadunidenses e europeias, que instigam a lideram demonstrações pró-ocidente, e que obedecem ao comando do Svoboda (partido neonazista ucraniano), manifestando tendências xenófobas, racistas, antissemitas e contra a Rússia”.
São agentes infiltrados que “organizam manifestações pacíficas” e “forçam governos a reagirem, até com violência, e assim serem acusados de excessos e de violar direitos humanos etc., o que passa a justificar a rebelião armada, financiada e equipada por forças externas e intervenções humanitárias”.
É o que tem acontecido na Venezuela, sendo que “Moniz Bandeira não descarta uma crise desse tipo no Brasil”.
Fonte: José Arbex Jr.: “Eurásia é o nome do jogo” e Miguel Ángel Barrios: “Pátria grande: América Latina e Venezuela na nova estratégia de defesa dos EUA” (Revista Caros Amigos, abril de 2014).
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Autor: Oswaldo Miqueluzzi