16/12/2024
Acordo entre empresa e sindicato permitiria as condições degradantes; juíza fala em ‘trabalho análogo à escravidão’ Os relatos de exaustão das pessoas submetidas à escala 6×1 sensibilizaram uma grande parcela dos trabalhadores brasileiros. Um dia de folga para seis trabalhados – regime que parecia inquestionável e “normal” até pouco tempo atrás –, agora, tomou o lugar do absurdo, do inaceitável. A repercussão nacional deu voz a trabalhadores que relatam condições e escalas ainda mais degradantes e alegam existir manipulação de banco de horas, transgressão de direitos e cumplicidade dos sindicatos com a patronal. É o caso dos trabalhadores da Companhia Zaffari, uma empresa tradicional do Rio Grande do Sul e um dos maiores monopólios do varejo de alimentos brasileiro. Os trabalhadores relatam, além de até dez dias trabalhados sem folga, horas extras obrigatórias em todos os finais de semana, sem compensação salarial. O salário líquido médio de um funcionário da rede é de R$1.200. Com 12.500 funcionários, a Companhia Zaffari é a 12ª maior rede de hipermercados do Brasil, cujo faturamento, em 2023, foi de R$ 7,6 bilhões. “Em outros empregos, eu sempre trabalhei cinco por dois ou seis por um. Mas nunca assim. Pelo menos, eu conseguia falar com o chefe pra conseguir uma folga numa sexta, num sábado. Mas, aqui não tem esse diálogo. Sábado eles nunca dão folga. E a gente chega a trabalhar três domingos seguidos”. O sentimento é de desvalorização, desamparo e muita indignação de ver a vida passando dentro de um hipermercado, para ganhar um salário líquido abaixo do mínimo nacional. “Ninguém aguenta muito tempo”, constata. Estes relatos são comuns aos trabalhadores de diferentes unidades da Companhia Zaffari. Apesar de contrariar diretamente a legislação trabalhista, que prevê descanso remunerado aos domingos no intervalo máximo de três semanas (ou seja, a cada dois domingos trabalhados, o próximo deve ser folgado) e veta a possibilidade de estender a jornada para além de seis dias, segundo os funcionários ouvidos pela reportagem, a empresa tem na violação destes direitos a regra do seu regime de trabalho. Uma operadora de caixa que pediu para não ser identificada denunciou a mesma situação. “Tem gente que trabalha dez dias só pra ter uma folga. No domingo, a gente entra super cedo para sair super tarde. Eu acho isso um absurdo”. A funcionária começou a trabalhar na empresa enquanto ainda estava na escola. “Eu não tenho mais vida. Eu chegava com sono na escola e não conseguia prestar atenção. Eu estudava de manhã e trabalhava de tarde. Eu estava sempre cansada e eles brigavam comigo por estar cansada”. Por fim, revelou ter colegas que saíram do mercado com ansiedade e depressão. “A gente ganha pouco e ainda tem que gastar dinheiro com terapia, porque...10/11/2024
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê algumas formas para dividir as 44 horas da jornada semanal de trabalho. Dentre elas, há a escala 6×1, em que o empregado tem seis dias consecutivos de trabalho e, depois, um dia de descanso. Nessa escala, a empresa pode definir quais são os dias trabalhados e qual o dia da folga. Além disso, um dia de trabalho nessa escala gira em torno de 7 horas e 30 minutos. A escala de trabalho 6×1 é uma das jornadas mais adotadas no Brasil e contempla, principalmente, operações de trabalho contínuas. Assim, a empresa pode organizar os dias trabalhados e folgas dos trabalhadores sem interromper a operação do negócio. Ou seja, se a pessoa começa trabalhar na segunda-feira, sua folga será no domingo. Porém, se ela começa trabalhar na terça-feira, a folga será na segunda e assim por diante. Contudo, a cada quatro ou sete semanas, o trabalhador precisa que sua folga ocorra no domingo. Além disso, o expediente gira em torno de 7 horas e 30 minutos. Porém, também é possível ter uma jornada de 8 horas de segunda à sexta-feira e, no sábado, uma jornada de 4 horas. A única coisa que o empregador não pode fazer é definir uma jornada de mais de 8 horas diárias. Os setores em que escala 6×1 é mais frequente Considerando a característica de operações ininterruptas, os setores que mais adotam a escala 6×1 são, por exemplo: Indústria; Serviços essenciais: como farmácia, mercados, restaurantes, hotéis; e, Manutenção e limpeza. Movimento pelo fim da escala 6×1 O movimento Vida Além do Trabalho (VAT), liderado pelo vereador pelo PSOL/RJ, Rick Azevedo, tem como principal pauta o fim da jornada de seis dias de trabalho para um de folga (6×1), luta para a qual já conseguiu reunir mais de 1,3 milhão de assinaturas em uma petição pública. A luta alcançou o Congresso Nacional, com uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), apresentada pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP), pela redução da jornada de trabalho. De acordo com Azevedo, “ninguém pode viver tendo só apenas um dia de folga. A escala 6 por 1 é um modelo ainda de escravidão que continuou. Por isso que falo isso e reafirmo sem medo algum: não tem como a gente falar de vida além do trabalho só tendo apenas um dia de folga”. Erika Hilton propôs Requerimento de Audiência Pública (REQ) para discutir o fim da escala 6×1 em abril deste ano e a proposta foi aprovada no mesmo mês. Desde então, a discussão sobre o fim da escala 6×1 vem crescendo na sociedade civil. A alta do tema também está atrelada à tentativa de transformar a discussão em um Proposta de Emenda Constitucional (PEC). Para...