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A questão “corrupção” foi o prato co­mercial (trivial simples) da última elei­ção para a Presidência. Este sempre foi o assunto preferido pela direita mais reacionária – aliás, 50 anos depois, ain­da nos parecia ouvir os ecos dos nitri­dos de Jânio Quadros, Carlos Lacer­da, militares, Senhoras Católicas e toda a corja que articulou e desencadeou o golpe contra o presidente (e estadista) João Goulart.

 

Deu no que deu: descartados pela Sor­bone com o Ato Institucional Número 5 (AI-5), os senhores Jânio, Lacerda e ou­tros tantos foram cassados por corrup­ção, e tratados como lixo pelo novo re­gime no pós-1968. Afastados pelas ves­tais verde-oliva, abria-se assim o espaço para que estas se locupletassem sem ve­lhos concorrentes, num período em que a corrupção atingiu níveis nunca antes sequer imaginados.

 

Para termos apenas uma pequena noção do que aconteceu, lembramos o episódio em que empresários france­ses que investiam ou pretendiam inves­tir no Brasil, durante o governo do ge­neral Ernesto Geisel, reclamaram con­tra o aumento da caixinha do então em­baixador do Brasil em Paris, que passa­ra a cobrar 20% do valor total de cada projeto, para que os aprovasse. De acor­do com os franceses, isto significava o dobro do que era cobrado normalmen­te (!!!) no mercado. A nossa sede diplo­mática na França passou a ser conhe­cida na Europa e em outras partes do mundo, como “A Embaixada dos 20 Por Cento”.

 

Quem quiser se informar com mais detalhes, profundidade e extensão so­bre a corrupção durante o regime ci­vil-militar do pós-1964, sugerimos que pesquise – principalmente, entre ou­tras – as edições dos jornais Movimen­to e Em Tempo, publicados por corren­tes da esquerda socialista da resistên­cia contra a ditadura. Aliás, este pode­ria ser um bom tema para trabalhos de conclusão de cursos, dissertações e te­ses universitárias. É compreensível (e previsível) que alguns reitores não se sintam muito à vontade com esse tipo de assunto, e prefiram continuar gas­tando o dinheiro público em trabalhos mais bizarros, com títulos do tipo “Car­tografia da solidão – Estudo de caso: Eu” e outros tantos.

 

É fundamental também não esque­cermos que foram os militares e civis que organizaram o monopólio do cri­me organizado no Brasil – quem tiver dúvidas, sugerimos a leitura dos depoi­mentos do delegado do DOPS capixaba Cláudio Guerra, no livro Memórias de uma guerra suja, dos jornalistas Rogé­rio Medeiros e Marcelo Netto (Editora Topbooks, 2012).

 

Mas se a hipocrisia militar não teve e se mantém sem limites, seus sucessores seguem o mesmo caminho.

 

O ex-presidente José Sarney – o Bele­trista, não nos deixa mentir: comprou – com dinheiro público – um antigo con­vento em São Luís, incorporou o pré­dio histórico ao seu patrimônio e lá fun­ciona o seu Memorial, onde já tem até mausoléu para a família – que descan­sem em paz. Isto para não nos determos em todas as tramóias e passa-moleques conduzidos pelo Poderoso Chefão ma­ranhense e sua insaciável famiglia.

 

Por sua vez, o ex-presidente Fernan­do Henrique Cardoso – O Príncipe dos Sociólogos (“Amore!!!”) e candidato ao título de Maior Reserva Imoral do País, com um requinte próprio dos aristocra­tas, chegou à sofisticação de ter um En­gavetador Oficial de processos – o pro­curador-geral da República do seu go­verno, doutor Geraldo Brindeiro que, dos 626 inquéritos criminais que rece­beu, engavetou 242 e arquivou outros 217. Mas o problema do PSDB não es­tá apenas com o Príncipe. Plebeus, ga­tos e cachorros – para não falarmos de ratos e baratas – também cultivam seus lances. É mais que conhecido todo o processo de privatização de nossas em­presas públicas (quem quiser se infor­mar melhor, que leia A Privataria Tu­cana, livro do jornalista Amaury Ribei­ro Jr. Geração Editorial, 2011) e não nos custa citar alguns casos mais emblemá­ticos, como “O mensalão mineiro”, “O anel viário de São Paulo”, os trens pau­listas etc. etc. Mas, para não perdermos tempo e espaço com uma lista intermi­nável dos crimes dos tucanos, sugeri­mos que procurem e leiam o ranking da Justiça Eleitoral sobre corrupção, onde se conclui que “o PSDB é o partido mais sujo do Brasil”.

 

Com relação às três gestões petistas, todos os escândalos denunciados têm sido apurados e discutidos em CPIs pú­blicas, levando réus à prisão, para o que o Supremo Tribunal Federal, sob o rei­nado do doutor Joaquim Barbosa, não hesitou em manipular o processo, de­sencavando – de modo inédito para o STF – a Teoria do Domínio do Fato, que distorceu do modo que lhe foi mais conveniente, provocando protestos até mesmo do autor dessa teoria, o jurista alemão Claus Roxin.

 

Ora, não se trata aqui de descrimina­lizar a corrupção quando os acusados são nossos amigos, confrades, compa­nheiros, camaradas, ou ligados a tal ou qual partido.

 

Não se trata menos ainda de graduar a corrupção entre corrupção mais grave ou menos grave.

 

Corrupção não se discute. Corrup­ção deve ser investigada, julgada e seus responsáveis punidos em consonância com as leis em vigor. E uma vez conde­nados, cumprir a condenação.

 

Apesar de toda canalhice da grande mídia comercial que tenta estigmatizar o Partido dos Trabalhadores, como se a corrupção em nosso país houvesse sido inventada pelo PT (também por isto), é preciso não esquecer que foram os go­vernos petistas (apesar de todo e qual­quer problema) os únicos – desde 1964 – a tomar medidas e criar instrumentos contra a corrupção.

 

Explicamos: foi ainda na primeira gestão do presidente Luiz Inácio Lu­la da Silva que os ministérios, secreta­rias, empresas públicas e demais órgãos federais começaram o processo de im­plantação de programas que permitem a qualquer cidadã/o acessar as infor­mações desses diversos setores, geran­do uma transparência que permite o co­nhecimento e controle das ações, gastos etc. do governo. Esse processo teve con­tinuidade durante a gestão da presiden­ta Dilma. Mas são exatamente aqueles que ostentam nos palanques a bandei­ra contra a corrupção, aqueles que se opõem a todas as iniciativas nessa di­reção.

 

Quando, logo após sua reeleição, a presidenta Dilma Rousseff teve seu de­creto sobre a criação de Conselhos Po­pulares recusado pela maioria da Câ­mara Federal era exatamente disto que se tratava: não temos qualquer dúvida que um dos mais eficientes instrumen­tos (senão o mais) para pôr fim à cor­rupção e outras mazelas do nosso país é exatamente avançarmos rumo a uma democracia participativa onde, sob o controle dos trabalhadores, do povo (povo = explorados e oprimidos) e de­mais camadas da população, as polí­ticas de Estado e Governo possam ser acompanhadas desde sua formulação até sua execução.

 

O voto da oposição de direita contra a presidenta não foi apenas uma vontade de derrotá-la, de mostrar “quem-é-que­-manda”. Mais que isto, foi um voto pa­ra impedir o começo do fim da corrup­ção, da troca de favores, do jeitinho, da impunidade.

 

Apesar de todo o carnaval da gran­de mídia que se apresenta com um ser de pureza virginal, guardiã da ordem e dos “bons costumes”, o que esses senho­res querem é um país em que eles pos­sam prosseguir saqueando de todos os modos, como agiram os dirigentes da di­tadura, como age o senhor José Sarney, o senhor doutor honoris causa Fernan­do Henrique Cardoso, o senhor Fernan­do Collor de Mello, o doutor José Serra e o aspirante e empresário do setor Aécio Neves, seus colegas e cúmplices Perrela, Joaquim Barbosa e toda essa caterva.

 

*Alipio Freire é jornalista, escritor, artista plástico e cineasta. Membro do Conselho Curador do Memorial da Anistia e dos Conselhos Editoriais do jornal Brasil de Fato e da Editora Expressão Popular, colabora com publicações e blogs de movimentos e organizações populares.

 

Autor: Alípio Freire

Publicado em 13/11/2014 -

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